Imaginemos que Portugal numa época não especificada, mas que aparenta ser nos princípios dos anos 90 do século passado, é assolado por um grupo terrorista de esquerda, de inspiração maoísta, que faz atentados, assaltos, etc., tal como um I.R.A. ou uma E.T.A.
Imaginemos que é criada uma brigada especial da polícia chefiada por um juiz de instrução e que é apanhado um terrorista que por acaso é um amigo de infância desse mesmo juiz que chefia as investigações.
António Lobo Antunes, com este mote traz-nos mais outro livro fabuloso, cheio de ironia e que com o seu estilo inconfundível de escrita explora o lado mesquinho das pessoas.
Apesar de estar dividido em seis partes, este livro pode-se dividir em duas grandes partes principais, a primeira parte aborda e explora a relação entre o juiz, que como atrás disse é escolhido pelo próprio governo para chefiar as investigações e o interrogatório do "homem" (seu amigo de infância) um elemento de uma célula do grupo terrorista que assola Portugal e que foi capturado pela polícia, sendo que a segunda parte se foca nas pequenas estórias dos intervenientes da acção, tais como os restantes elementos do grupo terrorista e outras personagens periféricas e também nas acções levadas a cabo pela polícia para a captura do grupo terrorista.
A estória da amizade entre o juiz e o homem, é complicada, são amigos de infância, mas o juiz é filho de pais pobres e humildes sendo o pai um alcoólico e que vêm da província para Lisboa para trabalharem como caseiros na quinta de Benfica que pertence aos avós do Homem.
O Homem, cuja mãe morreu num acidente de automóvel e o pai que ficou com graves deficiencias mentais devido ao mesmo acidente, vive com os avós e é um autentico "menino de bem".
Ambos quando crianças partilham de brincadeiras, partidas, aventuras, sendo que muitas vezes (ou quase sempre) o juiz é "usado" pelo homem e fica sempre com as culpas quando as coisas correm mal e são apanhados a fazerem "asneiras". Entretanto vão crescendo, o juiz torna-se num aluno aplicado, vai para a universidade e consegue ser juiz e o homem, sempre preguiçoso, sem ambição não segue os estudos e vai trabalhar para a companhia de seguros do avô mas num nível inferior e com a idade vão-se separando e perdendo a amizade um pelo outro.
Até que o homem que foi aliciado por um colega de trabalho que pertence aos terroristas e o recruta, cai numa armadilha e é capturado pela polícia. O juiz escolhido por causa da sua ligação com ele em criança inicia os interrogatórios, e é aí que vê (lê) a mestria da escrita de Lobo Antunes, que intercala passado com presente de uma forma natural e fluida sem nunca baralhar o leitor.
A seguir aos interrogatórios, o Homem é solto mas a trabalhar para a polícia de forma a ajudar na captura dos restantes elementos do grupo terrorista e a partir daqui Lobo Antunes pega nas pequenas estórias dessas diversas personagens e com muita ironia e até com alguma comédia traça um retrato de Portugal da época, os seus vícios, as suas "vigarices" e "esquemas", os abusos de poder, a política, a falsidade e a traição.
Fala também da decadência, do Portugal do antes 25 de Abril 1974, o Portugal das grandes famílias, quase ainda feudal que se transforma com uma rapidez impressionante num Portugal de acelarado urbanismo descontrolado e valores e ideais totalmente diferentes dos anteriores.
Dos diversos livros de Lobo Antunes que já li, este foi sem dúvida o mais simples de ler e o mais divertido e irónico, gostei bastante e até o aconselho a quem nunca leu Lobo Antunes e se queira iniciar na sua leitura.
3 comentários:
nunca li nada do LObo antunes. Os livros dele não são chamativos, não sei. Um dia pode ser que leia, até para criar uma opinião acerca da sua escrita.
Boas leituras.
Gostei da sua opinião e por essa razão enviei-lhe um e-mail. Pode por favor verificar e responder? Obrigado.
Caro José Alexandre Ramos, obrigado pela sua opinião, mas infelizmente não recebi nenhum email seu.
Deixo aqui o meu endereço electrónico para enviar de novo o seu mail.
npipas@gmail.com
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