segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

"O Meu Mundo não é deste Reino" - João de Melo




Um dos escritores nacionais que muito já tinha ouvido falar mas que nunca tinha lido, era João de Melo.
João de Melo, nasceu nos Açores mas veio ainda criança estudar para o Continente, começou igualmente também muito cedo a escrever, publicou o seu primeiro conto aos 18 anos e partir daí nunca mais deixou de estar ligado à escrita, esteve em Angola durante a guerra colonial (escreveu um livro sobre essa sua experiência de guerra) e é um dos mais activos divulgadores da cultura Açoriana.
"O Meu Mundo não é deste Reino", foi o seu primeiro livro, editado em 1983, já vai na 8ª edição, edição essa que foi toda revista e reescrita pelo autor, e foi essa edição que li.
Assim de repente, posso adiantar que foi o livro mais bonito que li este ano, a par do "Stoner", de John Williams, foi o que eu mais gostei de ler.
O livro como não será de estranhar é passado nos Açores, mais propriamente na ilha de São Miguel, numa freguesia do Nordeste e conta-nos a história dessa freguesia deste a descoberta da ilha e respetivo povoamento até provavelmente aos anos 50 do século XX, apesar da ação principal se situar desde o fim do século XIX até como atrás disse aos anos 50 do século XX.
João de Melo mostra-nos num tom quase místico, melancólico a vida dura dos Açores, o isolamento, a luta contra a natureza, com os vulcões, os terramotos, as tempestades, mostra-nos também a pobreza extrema das populações, as difíceis condições de vida, quase como se fossem náufragos, onde se vivia uma vida inteira sem se sair da freguesia, onde o outro lado da ilha era quase tão longe como o outro lado do mundo, fala-nos também das tradições, da cultura (e falta dela) dos Açores.
A ação propriamente dita, começa com a chegada do padre Governo à freguesia, ainda jovem e idealista e conta-nos a vida de uma série de personagens da freguesia desde esse momento até à morte do padre muitos anos mais tarde.
Temos então o padre, um curandeiro, uma espécie de mendigo/Messias, um regedor tirano, um agricultor pobre com a sua mulher e filhos, ou seja uma profusão de personagens com contornos um tanto ou quanto fantásticos, cujas vidas se entrelaçam numa série de acontecimentos e que tornam o particular no geral.
Neste livro também há uma série de acontecimentos fantásticos como os 99 dias de chuva seguida sem parar, o milagre da primeira missa, a ressurreição de João Lázaro ou o dia em que se viu a outra face do sol, tudo isto são ingredientes que no fim têm como resultado este livro fabuloso, bem ao estilo do realismo mágico sul americano. Para além de tudo isto há também a crítica social, a exploração dos pobres feita pelos grande agricultores, a ausência de organismos estatais que permitiam os excessos e essa exploração dos mais pobres, o analfabetismo das populações, e a crença excessiva na igreja.
Este livro a mim também me diz mais alguma coisa porque vivi nos Açores (ilha do Faial) durante dois anos e já lá estive diversas vezes depois disso e tenho o privilégio de conhecer a mística Açoriana e a insularidade.
Já tenho outro livro dele "Gente Feliz com Lágrimas", o mais conhecido em fila de espera para ler.


domingo, 6 de dezembro de 2015

"Desmobilizados" - Phil Klay


Este é o primeiro livro de Phil Klay, e que livro!!!
"Desmobilizados", tal como o título indica é sobre a guerra, mais propriamente sobre os soldados que lá combateram e o seu regresso à vida "normal".
O autor escrevendo com muito conhecimento de causa, foi soldado nos "Marines" (Fuzileiros) Norte-Americanos, combateu no Iraque em 2007 e 2008, viveu muito de perto a guerra, a vida militar, toda a sua orgânica, sentiu e viu toda a espécie de sentimentos e acontecimentos a que um soldado pode estar sujeito num teatro de operações difícil como foi o Iraque e depois após a sua desmobilização, o regresso a um mundo civil e familiar que nunca mais será visto com os mesmos olhos.
Este livro é composto por doze contos, todos eles diferentes abrangendo um leque variado de situações, tanto no teatro de operações, como por exemplo no conto "OIF", onde de uma forma irónica e através das siglas utilizadas pelos "Marines" se mostra a burocracia da guerra, ou do conto "Oração na Fornalha", onde se mostra através dos olhos do Capelão de uma unidade de "Marines" a violência de alguns soldados e a expiação dessa mesma violência, como na difícil integração e regresso à vida civil e familiar, sendo logo exemplo disso o primeiro conto "Fim de Missão" (publicado pela revista GRANTA americana), que nos mostra através da ligação do soldado com o seu cão de estimação a reaprendizagem da vida doméstica, ou do conto "Histórias de Guerra" que traz-nos um soldado ferido e desfigurado e a sua alegria de viver apesar da sua condição, ou também o conto "O Dinheiro Como Arma", que nos mostra a guerra vista pelo lado de um civil integrado numa ONG e as respectivas "negociatas" e corrupção existente no Iraque para a sua "reconstrução".
Apesar de algumas partes mais violentas, o livro lê-se bastante bem, os contos não são muito extensos mas agarram-nos à sua leitura, são muito bem escritos, como é provado pela série de prémios literários inclusive o "National Book Award"  que Phil Klay recebeu após a sua publicação.
Este livro foi editado pela nova chancela da editora 20/20, "Elsinore", que tem lançado uma série de livros de qualidade e com um aspeto gráfico muito apelativo.

terça-feira, 17 de novembro de 2015

"O Navegador da Passagem" - Deana Barroqueiro


Um dos livros que li durante esta minha ausência, foi este "O Navegador da Passagem" de Deana Barroqueiro.
Neste livro a autora dá-nos a conhecer um dos maiores "navegadores" Portugueses, Bartolomeu Dias e numa mistura de ficção com realidade conta-nos de uma forma envolvente e agradável dois dos maiores acontecimentos da saga dos "Descobrimentos Portugueses"; a "Dobra" do Cabo da Boa Esperança, que abriu caminho à posterior ida à Índia por Vasco da Gama e o "achamento" do Brasil por Álvares Cabral, dois acontecimentos nos quais Bartolomeu Dias esteve envolvido directamente, principalmente na "Dobra" do Cabo da Boa Esperança.
A estória em si inicia-se com Bartolomeu Dias, que comandava um dos navios que fazia parte da armada de Álvares Cabral, já depois de descoberto o Brasil e no regresso da ida à Índia, justamente na área do Cabo da Boa Esperança vê um cometa e isso traz-lhe um pressentimento desagradável e ao mesmo tempo faz recordar-se das suas anteriores viagens.
A partir daqui a autora através das memórias de Bartolomeu Dias inicia a acção, cruzando as recordações da viagem de descoberta do "Cabo" que tanto marcou Bartolomeu Dias, devido aos infortúnios próprios das viagens de descoberta da época, doenças, conflitos entre a guarnição, conflitos com os nativos, tempestades, acidentes, mas também devido a uma missão que D. João III lhe incumbiu para levar a cabo durante a viagem, que muito o vai transtornar, com a descoberta do Brasil e os dias lá passados com os nativos.
Neste livro para além da parte ficcional, também a parte histórica é excelente e isso advém da experiência e conhecimentos da autora, que para além de ser licenciada em Filologia Românica é igualmente uma especialista nesta época história de Portugal, chegando a trabalhar em comissões de comemoração dos Descobrimentos Portugueses e todo esse conhecimento e experiência vai-se notando ao longo do livro em que todos os acontecimentos históricos relevantes são parte da acção, como por exemplo o reinado de D. João III, a controversa subida ao trono de D. Manuel I, as intrigas na corte, os casamentos e acordos entre Portugal e Castela, toda a situação geo-política da Europa na época, mas também a parte social, o povo e principalmente a vida a bordo tão bem descrita pela autora.
Foi o primeiro livro que li desta autora e gostei bastante, recomendo vivamente principalmente para quem se interessa por esta época áurea de Portugal.

domingo, 11 de outubro de 2015

"Os Melhores Romances Escritos em Língua Portuguesa" - Projecto Adamastor



O "Projecto Adamastor", um site que tem por objetivo disponibilizar obras literárias em português de domínio público em formato digital livre (epub), está a fazer uma espécie de sondagem/pesquisa sobre "os melhores romances escritos em língua portuguesa".
Nesse sentido, fui contatado por um dos responsáveis do projeto, o Ricardo Lourenço, para através do "O que eu leio" divulgar e apelar à participação dessa mesma sondagem/pesquisa.
Sendo assim, quem quiser participar só tem de aceder à pagina do questionário e indicar na vossa opinião quais os dez melhores romances escritos em português e respetivos autores, bastante fácil e rápido.
O questionário está aberto até janeiro do próximo ano, sendo depois nesse mesmo mês divulgados os resultados.
Eu já participei, façam o mesmo.

quinta-feira, 8 de outubro de 2015

Prémio Nobel da Literatura 2015


E pronto... mais uma vez a academia Sueca atribuiu o Nobel a um escritor, neste caso  uma escritora que eu desconhecia totalmente...
Svetlana Alexievich, Bielorrussa escritora e jornalista é a vencedora do prémio este ano, e esta é a justificação do comité para a atribuição do Nobel:

"Sara Danius, secretária permanente da Academia (a ensaísta sueca sucedeu a Peter Englund em Junho e tornou-se a primeira mulher a exercer o cargo), destacou a “obra polifónica” de Alexievich, que descreveu como “um memorial ao sofrimento e à coragem na nossa época". A escritora bielorrussa inventou “um novo género literário”, disse ainda Danius, considerando que a premiada faz a fusão entre literatura e jornalismo e “criou uma história das emoções, uma história da alma”."

Sei que existe um livro dela publicado em Portugal pela Porto Editora - "O Fim do Homem Soviético – Um Tempo de Desencanto"  e que a nova editora "Elsinore" irá publicar outro durante o ano que vem.
Mais uma vez, os eternos candidatos como o nosso António Lobo Antunes, foram preteridos.
Mais informações sobre esta atribuição do prémio Nobel da literatura deste ano, aqui.

domingo, 20 de setembro de 2015

"Stoner" - John Williams


Como é possível escrever um livro sobre uma pessoa sem ambições, conformada com a vida, que aceita as adversidades praticamente com um "encolher de ombros" e esse mesmo livro conseguir ser de uma beleza indescritível e fazer com que nos apeguemos tanto a essa mesma personagem ao ponto de quase querermos entrar no livro para fazermos alguma coisa contra essa sua apatia...
Pois foi esta sensação que tive ao ler este livro de John Williams.
Em 1910 William Stoner o personagem principal, filho único de um casal de agricultores pobres, por vontade dos pais entra na universidade, para o curso de agricultura, alojando-se em casa de uns primos e trabalhando para eles fora das horas das aulas como forma de pagamento desse mesmo alojamento, vai aos poucos e poucos inserindo-se na universidade e no estudo, não sendo um aluno brilhante vai se "safando" até que um dia no segundo ano tem uma cadeira nova no semestre, Literatura Inglesa dada pelo professor Sloane.
Stoner apaixona-se pela disciplina e troca de curso, faz a licenciatura e é convidado a ficar na universidade para continuar o mestrado. Entretanto rebenta a I Guerra Mundial mas Stoner não se alista e fica a terminar o mestrado.
Após a guerra terminar, Stoner é convidado a ficar na universidade a dar aulas e aí fica até se reformar e morrer.
Mas a vida de Stoner vai ser uma vida apática, conhece e casa com Edith, mas este casamento vai ser sempre um casamento falhado, Edith é uma pessoa fria que casa sem amor com Stoner, têm uma filha que também será usada por Edith para dificultar o seu casamento, também na universidade Stoner tem um grave conflito com um colega que o irá perseguir durante toda a sua carreira, inclusive na única altura da sua vida em que ele é feliz devido a um relacionamento amoroso intenso com Katherine, uma professora assistente mais nova que ele que estava a também a fazer um mestrado na universidade.
Apesar de todas estas vicissitudes Stoner sempre aceitou o seu destino, nunca lutou, a sua única preocupação é a universidade, o estudo e ser um bom professor, nunca quis cargos mais altos e prescindiu do amor e da felicidade em prole disso.
Apesar de aparentemente este livro não ter os ingredientes necessários para não ser um grande livro, é justamente isso mesmo que ele é, um grande livro...
Uma história e uma personagem com uma beleza interior enormes, uma paz de espírito sem precedentes, e por debaixo de uma fraqueza e uma apatia perante as adversidades da vida, encontra-se uma força interior grandiosa e irradiante de uma pessoa que tudo fez para que o seu grande amor e objetivo de vida se concretizassem nos moldes mais corretos e puros.
John Williams ele mesmo uma espécie de Stoner, foi também professor universitário, apenas escreveu quatro livros em vida, nunca alcançou grande sucesso e só anos mais tarde após a sua morte é que este seu livro foi redescoberto e então reconhecido como um excelente livro e ele um excelente escritor.
Pela sua sensibilidade este livro tocou-me e gostei bastante.

quinta-feira, 17 de setembro de 2015

"O Almirante Português" - Jorge Moreira Silva


Este é o primeiro livro de ficção de Jorge Moreira Silva.
Jorge Moreira Silva, é oficial superior da Marinha Portuguesa, (quem me conhece sabe que tenho uma grande ligação com este ramo das Forças Armadas), com cerca de vinte e sete anos de carreira, que já prestou serviços em diversos navios e participou em várias missões importantes, como a da Guiné-Bissau em 1998 ou em Timor em 2000, para além de oficial da Armada é igualmente "Mestre" em História Marítima com diversos livros e artigos científicos publicados.
Ao saber disto tudo, naturalmente que este livro me despertou uma grande curiosidade.
O livro pode ser dividido em duas partes, uma maior onde se passa a maior parte da acção do mesmo e outra mais pequena onde após vários anos depois se mostra o destino das diversas personagens.
A acção inicia-se trinta anos depois dos acontecimentos principais onde uma das personagens está preste a ser enforcado e começa a recordar o passado, aí somos transportados para o fim do século XVIII (1798) período do inicial das guerras Napoleónicas, onde Portugal envia uma esquadra de navios de guerra para o Mediterrâneo comandados por D. Domingos Xavier de Lima, o Marquês de Nisa, personagem principal do livro, para auxiliar a esquadra Inglesa comandada por Lorde Nelson.
Chegados aos Mediterrâneo, os portugueses vêm-se envolvidos em diversos acontecimentos militares como o cerco a Napoleão no Egipto, o bloqueio da ilha de Malta, várias acções contra os piratas do norte de África e a reconquista de Nápoles, episódio esse que será o clímax da acção.
Após estes acontecimentos no Mediterrâneo vem a segunda parte, que trata do destino das diversas personagens durante o resto das guerras Napoleónicas, a fuga da família real para o Brasil, a independência do mesmo, e o início da guerra civil em Portugal entre absolutistas e liberais.
Para além de toda esta parte de acção o livro também tem a parte humana, amor, intriga, traições, política, (principalmente a difícil relação entre Portugal e a Inglaterra), uma panóplia de situações, emoções e acontecimentos que fazem com que este livro seja de uma leitura agradável e envolvente.
De referir, que quase todas estas personagens existiram mesmo e que quase todos estes acontecimentos foram reais, o autor no fim do livro fez uma nota explicativa onde nos mostra o que é história e realidade e o que é ficção, temos também um glossário com os significados dos diversos nomes e expressões náuticas e de marinharia, que a maioria das pessoas não conhece.
O livro é muito interessante, bastante fácil de se ler, a acção é encadeada e coordenada o que torna este livro de rápida leitura, muito ao estilo da famosa saga "Master and Commander" de Patrick O'Brian, também passada na mesma época histórica.
Apenas penso que este livro tem temática para um pouco mais, mas sendo o primeiro livro de um autor que nada tem a ver com a vida literária até acho que está bastante aceitável, espero que o sr. Cmdt Jorge Moreira Silva continue com esta sua "aventura literária" e fico a aguardar o(s) próximo(s) livro(s).

terça-feira, 15 de setembro de 2015

"O Fio da Navalha" - Somerset Maugham


Este é o primeiro livro que leio de Somerset Maugham, escritor britânico que nasceu e morreu em França e que durante a sua longa vida percorreu o oriente, onde foi buscar muita da inspiração para a sua também extensa obra literária, sendo este livro um exemplo disso mesmo.
Este livro de Somerset Maugham, é nos contado na primeira pessoa, sendo o próprio escritor, narrador e participante na acção.
Maugham, numa das suas viagens ao oriente faz uma escala de várias semanas em Chicago, onde é convidado para um almoço por Elliott Templeton, um comerciante de arte e "socialite" Norte -Americano mas radicado em Paris seu conhecido, nesse almoço Maugham conhece a irmã de Elliott, Louisa Bradley, a sua filha Isabel e o respectivo namorado Larry Darrel que é sobre quem se centra toda a acção deste livro.
Larry Darrrel durante a I Guerra Mundial, serviu como piloto da Força Aérea em França, aí vê o seu melhor amigo a morrer para o salvar durante um combate aéreo e isso o vai transformar para o resto da vida.
Com o fim da guerra, após o regresso aos Estados Unidos, Larry começa a namorar Isabel e torna-se noivo dela, mas Larry voltou mudado, não tem interesse por nada, não sente vontade de trabalhar, torna-se apático, mas com com uma enorme sede de conhecimento.
Naturalmente para a efervescente sociedade Norte-Americana da década de 20 do século passado isso é considerado estranho e a família de Isabel tem muitas reservas, mas o amor de Larry por Isabel e de Isabel por Larry é muito forte e vai seguindo em frente apesar de tudo.
Larry decide voltar à Europa, nomeadamente Paris durante dois anos para a sua "busca" de conhecimento e Isabel decide esperar por ele. Ao fim desses dois anos aproveitando uma visita que faz a Paris e ao seu tio Elliott, reencontra Larry que cada vez mais se encontra embrenhado na sua sede de conhecimento, aí Larry que vive como um "asceta" num pequeno quarto alugado, sem se preocupar com conforto ou vida social propõe casamento a Isabel, mas Isabel que oriunda de boas famílias e sempre habituada ao conforto e à riqueza não aceita e rompem o noivado.
Entretanto, Larry desaparece, Isabel volta a Chicago onde casa com Gray Maturin, um jovem corretor na bolsa e os anos passam...
Em 1929 dá-se o "crash" na bolsa, Gray e Isabel perdem tudo, mas o seu tio Elliott que conseguiu passar incólume com a queda da bolsa, ajuda-os, vai viver para a Riviera Francesa e cede a sua casa de Paris a eles, entretanto Larry regressa e reencontra Gray e Isabel, surge uma nova personagem Sophie MacDonald que irá ter um papel preponderante para o desenlace final.
Tudo isto nos é contado através de Maugham que apesar de não ser um amigo chegado das personagens, (e talvez por essa mesma razão, se torna uma espécie de confidente deles), tem muitas conversas e desabafos com elas ao longo dos anos e é através dessas mesmas conversas e desabafos que nos relata a história de Larry e Isabel. Por ele ficamos também a saber o que foi de Larry durante os dez anos que esteve ausente, as suas viagens primeiramente pela Europa e depois pela Índia, país onde esteve durante cinco anos e onde finalmente atinge ou aproxima-se ao tão desejado "conhecimento".
Este livro para além da história de Larry e Isabel, mostra-nos a rápida mudança que houve nas primeiras décadas do século XX, onde em menos de nada se passa de uma sociedade "vitoriana", com classes sociais demarcadas, ao horror da guerra, ao renascimento e à "loucura" da década de vinte e depois novamente à crise e desespero da década de trinta que culminou com outra guerra mundial.
Outra situação também aqui retratada é a sede de conhecimento, mas um conhecimento interior, um misticismo, uma fé em algo superior seja o Deus dos cristãos ou as divindades hindus, que traz a Paz, a santidade e compreensão aos Homens.
Bastante bom e fácil de ler este livro de Maugham, considerado um dos seus melhores.

quarta-feira, 2 de setembro de 2015

"Roma" e "Império" - Steven Saylor


Hoje não venho falar de um livro, mas sim de dois livros...
Como é sabido de quem segue este blog sou um grande fã dos chamados "romances históricos" e umas das épocas e civilizações que mais me fascinam são os Romanos e o seu império.
Como se pode depreender pelo título dos livros, "Roma" e "Império" é sobre esses mesmos assuntos que eles tratam.
Steven Saylor, o autor destes livros é formado em História e também tem este período da História como preferido o que logo daí advém uma segurança quanto ao rigor dos livros em termos históricos.
Mas falando dos livros em si, o primeiro livro a ler é "Roma", que inicia a sua acção na idade do ferro, quando os primeiros povos chegam à região que hoje é Roma e aí se estabelecem, a partir daqui Steven Saylor inicia a sua "história" de Roma através de duas famílias os "Potícios" e os "Pinários" e de um amuleto que representa um deus ancestral, o "fascinum" que é passado de geração em geração pelos personagens acompanham-do-os até ao fim.
No livro "Roma" é descrita a criação da cidade Roma e todas as lendas e acontecimentos relacionados com ela, a vinda de Hércules e a luta dele com o monstro "Caco", Rómulo e Remo, e como Rómulo mata Remo e se torna rei de Roma, os reis que se seguiram, principalmente Tarquínio e o famoso episódio da violação de Lucrécia que faz com que se acabe a monarquia e se dê início à República Romana, o ataque a Roma do traidor Coriolano, (episódio onde se dá a queda da família Potício) o Decínvurato e as dozes tábuas que são a base do direito romano, a invasão e saque de Roma pelos gauleses, as guerras Púnicas com Cartago e o seu general Aníbal, os irmãos Gracos, a ditadura de Sulla e Júlio César e respectivo assassinato.
O período abrangido por este  livro termina com a morte de Cleóptra e Marco António e a coroação de Octávio como primeiro imperador de Roma.
Todos estes acontecimentos são nos descritos através da intervenção e olhar dos membros das famílias Potício e Pinário que foram intervenientes nestes acontecimentos e em que a certa altura se dá a extinção dos Potícios e sua junção aos Pinários.
No segundo livro, já temos Octávio Augusto como primeiro imperador, a época áurea do império e continuamos com a mesma fórmula, agora só temos os Pinários e é através deles que vamos conhecer os imperadores e acontecimentos mais importantes a seguir a Octávio, Tibério e Calígula com os seus excessos e devassidão, o assassinato de Calígula, e como Cláudio se seguiu como imperador, Nero com a sua excentricidade o incêndio de Roma, a perseguição dos cristãos, a entrega do império a Vespasiano após a morte de Nero, os filhos de Trajano o bondoso Tito e depois Domiciano, Trajano com a sua opulência e o livro termina com a morte de Adriano, encerrando assim cerca de mil anos da História de Roma e do seu império.
Estes dois livros estão muito bem conseguidos, Steven Saylor, tal como Max Gallo já tinha feito na sua série "Os Romanos" ao pôr a descrição dos acontecimentos através de intervenientes directos que participam e nos mostram toda a acção, ao longo das épocas faz com que o que poderia ser maçador se torne empolgante e emocionante, faz-nos sentir as emoções, as alegrias, as tristezas, os medos as inseguranças que as pessoas tinham nestas épocas tão conturbadas e efervescentes da história do Homem.
Além disso estes livros são de um rigor histórico excelente, apesar de no primeiro livro ser mais difícil porque a fundação de Roma e os seus primeiros anos são muito "dúbios", Steven Saylor descreve essas épocas e acontecimentos mais pela razão do que pela lenda, sendo exemplo disso as próprias famílias Potícios e Pinários que existiram mesmo.
O segundo livro é muito mais fácil porque a época abrangida é muito estudada e conhecida, sendo fácil seguir o rigor histórico.
Outra coisa que adorei nestes livros para além da acção é a descrição da sociedade Romana, os seus usos, costumes, religiões, mitologias, política, a mutação da cidade em si, o seu crescimento desde uma pequena aldeia até ser o centro do mundo, os seus monumentos, a via ápia, o panteão, o coliseu, a coluna de Trajano, e a sua urbanidade.
Estes livros são a meu ver "obrigatórios" a todos os que se interessam por Roma e pelos Romanos e que queiram saber mais sobre isso através de visão participativa em vez dos livros académicos, gostei imenso e recomendo.


quinta-feira, 27 de agosto de 2015

Reviver o Passado em Brideshead - Evelyn Waugh


O meu interesse neste livro surgiu há uns tempos e esse interesse só prova que a mente humana é uma coisa fantástica... Passo a explicar...
A minha "companheira" é uma seguidora acérrima da série de época inglesa "Downton Abbey" e eu também a vi-a com ela, mas (e aí entra a parte da mente humana/memória) lembrava-me muito vagamente de uma série do mesmo género (com o actor Jeremy Irons) que passou na RTP nos anos oitenta cujo ambiente era muito parecido, a sociedade inglesa do início do século XX e cujo nome ficou-me sempre gravado na memória, "Reviver o Passado em Brideshead".
Entretanto fiz umas pesquisas e descobri que essa série era baseada num livro e resolvi compra-lo para ler.
E aqui fica a minha opinião.
"Reviver o Passado em Brideshead", como atrás referi é passado no período entre a I e a II guerras mundiais, mas é narrada em "flashback".
Tudo começa quando em plena II guerra mundial, na Inglaterra, Charles Ryder, capitão miliciano do exército inglês é colocado mais a sua companhia de soldados numa área rural com uma enorme mansão senhorial que foi cedida ao exército, quando Charles vê onde está e reconhece o sítio, faz um retrocesso no tempo até à sua juventude e inicia a narração das suas memórias relacionadas com o sítio e com a família cuja casa e área circundante pertence.
Quando jovem em Oxford, Charles conhece Sebastian Flyte, outro jovem exuberante, rico e sensível e ambos se tornam muito amigos, mas Sebastian é um jovem que apesar de toda a sua exuberância e alegria tem muitos problemas, vive sob o peso da sua família, principalmente da mãe que apesar de inglesa é uma católica fervorosa que controla os filhos, o pai que se separou da mãe e vive em Itália com a amante, o irmão mais velho também muito controlador e igualmente religioso e Júlia a irmã que também vai ter um papel determinante na vida de Charles.
Ao longo dos anos, Sebastian vai-se degradando, torna-se cada vez mais alcoólico e isso vai causar a separação de Charles com a família Marchmain.
Anos mais tarde, já casado e estabelecido como pintor de sucesso, Charles reencontra Júlia, apaixonam-se e volta a aproximar-se dos Marchmain, até que após a morte do pai de Júlia e Sebastian voltam a separar-se.
Este livro é de uma beleza fantástica, Evelyn Waugh, que apesar do seu "mau feitio", deixou toda a sua mestria aqui, faz um retrato fiel da sociedade da época, dos "loucos anos 20", os excessos de uma juventude, o amor, a amizade e ao mesmo tempo contrapõe com o peso da religião católica, a fé e a falta dela, a rigidez da alta sociedade inglesa, criando um paradoxo com que as personagens tiveram de lidar e fazer as escolhas que determinaram a sua vida futura.
Gostei muito do livro e recomendo.
Para além da série dos anos 80, também foi feito um filme em 2008, que apesar de não estar 100% fiel ao livro, está bastante satisfatório e agradável.

Matilde Campilho




segunda-feira, 24 de agosto de 2015

Digital vs Papel


Hoje vou falar não sobre um livro específico mas sobre um tema que desde há algum tempo para cá tem vindo a criar muita "discussão" no (vou chamar assim) "meio dos livros".
Qual o melhor suporte para a leitura??? O clássico livro em papel?? Ou a leitura digital???
Neste meu post sobre este assunto, vou apenas dar a minha opinião, mostrar o meu ponto de vista, não vou defender nenhuma das formas de leitura, porque uso ambas.
Eu leio praticamente desde sempre, ainda antes de entrar na escola aos cinco anos, era fascinado pelos livros do "Donald" que o meu pai tinha em casa e queria saber o que os bonecos diziam, quase que obriguei a minha avó a ensinar-me a ler ainda antes de entrar primeira classe, claro que ao entrar na escola e ao longo do meu crescimento aprendi a ler melhor e o meu gosto pela leitura foi evoluindo, e o livro sempre me acompanhou desde aí.
Naturalmente que sempre li em papel, mas desde o advento da tecnologia e com a criação da leitura digital as coisas mudaram um bocadinho...
Há cerca de três anos comprei o meu primeiro tablet e logo aí uma das primeiras coisas que fiz foi instalar aplicações de leitura, decidi experimentar... Sim porque apesar do meu amor aos livros e à leitura, acho que tudo tem uma evolução.
Desde essa altura comecei a ler no tablet, entretanto já troquei de tablet para um melhor e continuei a ler, mas a leitura nos tablets tem desvantagens, a bateria dura pouco e a iluminação é muito forte para se passar muito tempo a ler, os meus olhos e a minha cabeça começaram a sentir-se, então decidi dar o passo seguinte, comprar um leitor digital específico para leitura os famosos "ereaders".
Já tinha pensado nisso anteriormente, mas como lia bem nos tablets achei que apenas ia duplicar os aparelhos e como o tablet serve para muito mais coisas do que só para ler deixei-me ficar, mas pelas razões atrás descritas, a semana passada e após alguma pesquisa sobre os assunto, decidi adquirir um ereader. Dos variados modelos que por aí andam acabei por escolher o "Kobo Aura" vendido pela Fnac.
Escolhi este modelo porque do que investiguei, sempre disseram muito bem do aparelho e pela facilidade e inúmera oferta de ebooks (em português) que a loja da Kobo/Fnac tem.
Estou muito satisfeito, o ereader é muito mais leve que o tablet, a bateria tem uma duração espantosa (carreguei-o quando o comprei, há uma semana atrás, tenho-o usado com alguma regularidade e nem metade gastou), a luminosidade não "fere" a vista é como se estivéssemos a ler em papel, os contras para mim só tenho a apontar o tamanho, preferia um pouco maior este modelo é de 6" (há maiores mas mais caros) e o preço... Acho que para o tipo de aparelhos que são, limitados (apesar de o Kobo ter wi fi e pode-se ir à net nele mas de uma forma limitada), não são tablets e há tablets bem mais baratos...
Agora se prefiro os ereaders ao livro "clássico"??? Evidentemente que não, ler um livro é sempre ler um livro, é uma coisa mágica, o objecto livro está carregado de simbolismo e emoção e nunca irei abdicar disso, aliás continuo a comprar livros como fazia antigamente. Mas o ereader tem outros atributos, a portabilidade, o conforto para mim que ando muito de transportes públicos isso é excelente, levo o ereader no saco ou na mochila, não pesa nada, não ocupa espaço e capacidade de armazenamento também nos permite (como no meu caso que por motivos profissionais por vezes tenho de viajar muito, por largos períodos de tempo e com pouco espaço para levar livros) ter um leque vasto de leitura num espaço mínimo.
Na minha opinião a leitura digital não vai "matar" o livro como alguns "arautos da desgraça" e "velhos do restelo" tanto profetizaram (pelo menos num futuro a curto e médio prazo) mas vem sim complementá-la, acho que quem lê nos ereaders também lê em papel, há situações para ambos os casos, eu pelo menos penso assim, mas acima de tudo acho que mais importante ainda do que o tipo de suporte da leitura, o mais importante é ler, adquirir conhecimento, cultura e prazer, isso sim é mais importante do que tudo o resto.

domingo, 16 de agosto de 2015

"Os Cadernos de Pickwick" - Charles Dickens



Quando se pensa em Dickens, vem-nos logo à memória livros como "Oliver Twist", "David Copperfield", "História de Duas Cidades" e o famosíssimo "Um Conto de Natal", livros em que Dickens nos traça uma visão pesada da difícil vida na Inglaterra vitoriana, o advento da revolução industrial, do capitalismo, as terríveis condições das classes mais baixas, com pobreza extrema e a exploração das classes pobres.
Com este "Os Cadernos de Pickwick", Dickens também nos traça igualmente uma visão crítica da Inglaterra da época, mas sob um olhar irónico, satírico e cómico.
Este livro, que originalmente não era um livro em si, mas um "folhetim" que foi publicado em vinte fascículos com ilustrações foi escrito entre 1836-1837 na juventude de Dickens, sendo quase de imediato um grande sucesso que muito contribuiu para a enorme fama como escritor que Dickens teve posteriormente.
Este livro tem como enredo, um suposto clube cujo presidente seria o Sr. Pickwick, personagem de alguma idade, com bastantes posses e solteiro que na sua reforma cria este clube como "base" para as suas viagens e adquirir com isso conhecimentos culturais e sociais, que depois seriam discutidos e debatidos entre os membros desse mesmo clube.
Pickwick, sempre acompanhado por três companheiros, inicia então o seu périplo pelos condados e regiões do sul de Inglaterra, onde irá passar por uma série de peripécias, situações rocambolesca, algumas até mesmo estapafúrdias  e inverosímeis, mas que no contexto da ação encaixam perfeitamente como situações naturais.
Apesar das situações cómicas deste livro, para mim, a grande alma do mesmo são sem dúvidas as suas personagens, para além de Pickwick, temos também os seus companheiros de aventuras e membros do clube que o acompanham sempre e também são parte importante como se verá ao longo do livro e temos especialmente Sam Weller, o criado de Pickwick, uma espécie de "Sancho Pança" que é uma das pedras fulcrais do livro, (foi após a entrada desta personagem na história que a procura da mesma se intensificou e tanta fama deu a este livro), com uma personalidade simples e sincera, mas extremamente inteligente e acima de tudo com uma lealdade a Pickwick acima de tudo e todos.
Para além destas personagens principais existem também toda uma série de outras personagens que vão desde ricos fazendeiros e as suas filhas "coquettes", vigaristas e oportunistas, advogados, juízes, caixeiros viajantes, cocheiros, boémios estudantes, senhorias solteiras e viúvas sempre prontas a casar novamente, jornalistas e políticos, enfim toda a sociedade inglesa da época desde a a mais alta à mais baixa, classe essa tão bem retratada nos capítulos referentes à prisão de Fleet.
Tal como nos seus livros seguintes Charles Dickens traz-nos neste livro uma visão muito crítica da Inglaterra da época, do seus usos e costumes, da sua justiça e leis que para uns (ricos) era extremamente flexível e para outros (pobres) de uma rigidez extrema, da política e a sua organização eleitoral, do jornalismo, dos hábitos sociais tanto das grandes cidades como Londres como das povoações mais pequenas, enfim um relato que apesar de muito irónico, satírico e cómico não deixa de ser completo e acertado.
Este livro é extremamente delicioso de se ler, consegue arrancar-nos umas boas gargalhadas e um sorriso que nos acompanha desde o princípio ao fim.

"Lista de espera"



Bom, como adoro ler e tenho este impulso incontrolável de comprar livros e  por vezes não tenho o tempo desejável para colmatar este vício, faz com que haja certas alturas em que a "lista de espera" dos livros vai aumentado, criando depois situações como a que me encontro agora...
Terminado o livro a que me tinha dedicado ultimamente, olho para a "lista de espera" e sinceramente nem sei o que irei ler a seguir... Os livros começam a empilhar-se, a diversidade é tanta que eu quase que entro em desespero pois não consigo decidir qual ler...
Sendo assim dividi os livros em duas categorias "Romance histórico" e "Romance" e peço a vossa ajuda para me ajudar a decidir qual livro irei ler em seguida...
Portanto na "categoria" de Romance histórico, tenho:

"O Corsário dos Sete Mares" e "O Navegador da Passagem" de Deana Barroqueiro
"O Almirante Português" - Jorge Moreira Silva
"Grandes Batalhas Navais Portuguesas" - José António Rodrigues Pereira (sendo que este livro é não ficção)
"As Garras da Águia" - Simon Scarrow
"As Sete Maravilhas do Mundo" - Steven Saylor
"Lendas e Narrativas" (vol. I e II) - Alexandre Herculano

Na "categoria" de romance são:

"Os Buddenbrook" - Thomas Mann
"A Minha Luta" (vol. I e II) - Karl Ove Knausgard
"Stoner" - John Williams
"Canada" - John Ford
"O Príncipe Negro" e "Uma Cabeça Decepada" - Iris Murdoch
"A Senda Estreita para o Norte Profundo" - Richard Flanagan
"Deixa Lá / Más Novas" Vol. I e II da "Família Melrose" - Edward St. Aubyn
"Auto-de-Fé" - Elias Canetti
"Reviver o Passado em Brideshead" - Evelyn Waugh

Nesta última lista, sendo que a saga "A Minha Luta" de Knausgard e "A Família Melrose" de St. Aubyn, ainda não estarem completas, penso que irei aguardar pelos restantes livros para ler todos de seguida, todos os restantes estão "prontos para a acção"!!!!
Deixem a vossa opinião (caso queiram ajudar-me) nos comentários
Obrigado

segunda-feira, 10 de agosto de 2015

"As Crónicas Saxónicas" - Bernard Cornwell


Tal como já referi em posts anteriores, um dos meus géneros preferidos de leitura é o chamado "romance histórico" porque alia duas das coisas que eu mais gosto, a leitura e a Historia, disciplina pela qual eu sempre fui apaixonado.
Dentro dos "romances históricos" há vários géneros, uns mais "sérios" e fieis aos acontecimentos em si e outros que apesar de serem também rigorosos na parte "científica" em si, permitem-se a criar situações e ações, que apesar de serem fictícias, mostram-nos à mesma os acontecimentos e a vida da época retratada mas por outros olhos. 
Um dos autores que mais utiliza essa última técnica é o britânico Bernard Cornwell, autor que eu já falei aqui no blog, devido a outra saga escrita por ele "Sharpe", que retrata as aventuras do herói com esse nome na altura das guerras Napoleónicas, principalmente na chamada "Guerra Peninsular" passada em Portugal e Espanha.
"As Crónicas Saxónicas" são tal como as "Aventuras de Sharpe" centradas numa personagem "Uhtred de Bebbanburg" sendo ele próprio o narrador, que sendo já velho vai contando a história da sua vida numa espécie de "memórias"e tudo isso se passa na ilha Britânica do séc. IX e X.
Nestes séculos, ainda não existia o país "Inglaterra", e a ilha estava dividida por vários reinos, a Escócia, Northumbria, Gales, Anglia Oriental, Mércia e Wessex, sendo "Uhtred" originário da Northumbria, (reino saxão mais a norte antes da Escócia).
A saga inicia-se precisamente na Northumbria mais propriamente em Bebbanburg, região que pertence à família de Uhtred desde a vinda dos saxões para a ilha Britânica, aí Uhtred vê a invasão Dinamarquesa, perde o seu irmão mais velho e o pai na luta contra os invasores, sendo ele raptado e criado por uma família Dinamarquesa. A partir daí Uhtred vai crescendo com os invasores, primeiro como escravo mas depois como parte integrante da família, abandona o cristianismo e converte-se aos deuses nórdicos, até que um dia a família adotiva é traída e morta, apenas escapando ele e o filho mais velho que na altura encontrava-se nas lutas na Irlanda, mas que mais tarde regressará e fará parte da saga.
Aqui dá-se a viragem na história, Uhtred tem de fugir para sul e após várias aventuras chega à corte do rei Alfredo de Wessex (o reino mais a sul da ilha Britânica e também o mais poderoso) onde se torna seu guerreiro jurado e vai combater os Dinamarqueses, auxiliando o rei Alfredo no seu sonho de criar um país único na ilha Britânica.
Mas apesar de ser próximo do rei Alfredo, a vida não é fácil para Uhtred, principalmente sendo ele pagão num reino e época de cristianismo fervoroso, vai ter vários inimigos, sofrer com intrigas e mentiras sobre ele. Além disto tudo, aquando da morte de seu irmão e pai, o castelo e as possessões de "Bebbanburg" que seriam suas por direito são-lhes roubadas pelo seu tio, sendo o maior objetivo da sua vida recuperar "Bebbanburg".
Isto aqui descrito é apenas um resumo e introdução da saga, Cornwell até este momento já escreveu oito livros, todos eles com um crescendo cronológico, retratando através de Uhtred o início e evolução da construção do país "Inglaterra" por Alfredo e seus sucessores.
Os livros em si são muito bem escritos, pormenorizados nos usos e costumes da época, as partes de ação são muito boas, as batalhas bem descritas, as lutas, o armamento, etc., tal como já nos tinha habituado no "Sharpe", o que nos cola aos livros e nos faz querer ler todos de uma assentada (tal como eu fiz), sendo que o último livro saiu recentemente na Inglaterra e nos Estados Unidos e eu nem esperei pela versão traduzida, li-o logo em inglês...
Eu li esta saga numa versão digital, porque apesar de já ter visto à venda um ou dois livros desta saga editados em português pela editora Planeta, penso que não os há todos editados por cá, o que é uma pena, sei que a "Saída de Emergência" está a editar outros livros deste autor pode ser que estes também sejam editados por eles, sendo que... a BBC está a fazer uma série de TV (ao género da "Guerra dos Tronos") desta saga que irá estrear em outubro, pode ser que sirva de incentivo...
A ordem dos livros para que esteja interessado em ler é esta:

- O Último Reino
- O Cavaleiro da Morte
- Os Senhores do Norte
- A Canção da Espada
- Terra em Chamas
- Morte dos Reis
- O Guerreiro Pagão
- The Empty Throne (ainda sem título em português)

Eu adorei esta saga, tem ação q.b., história, intriga, mistério, tudo o que é necessário para ser uma leitura que nos dá prazer e satisfação sem entrar em enredos muito complicados e desnecessários, aconselho. 

domingo, 9 de agosto de 2015

"Amadeo" - Mário Cláudio



Mário Cláudio escritor e poeta, nascido no Porto e com uma vasta obra literária, mostra nos neste seu “Amadeo” que um livro não precisa de ser extenso para ser uma grande obra literária.
O tema principal neste livro é a biografia “romanceada” do grande pintor português do início do século XX Amadeo de Souza-Cardoso. Mas para isso Mário Cláudio usa uma história paralela que serve de suporte à biografia do pintor.
Temos então duas acções paralelas que apesar de distintas uma da outra se complementam entre si.
A acção inicia-se com a biografia em si, com uma descrição da famosa casa de “Manhufe” em Amarante, o ambiente da casa, as criadas, o caseiro, a cozinheira e de tudo à volta dela, o Marão, os campos, a natureza Transmontana e depois é intercalada com o início da outra acção onde na forma de um diário, em que o narrador (cujo nome só saberemos no fim do livro) vai-nos mostrando como a biografia está a ser construída por “Papi” seu tio, um médico retirado cocainómano que vive atormentado pela escrita da biografia de Amadeo e pela decadência da sua quinta em que ambos vivem juntamente com uma criada alcoólica o marido e seus filhos.
A partir daqui as duas narrativas vão crescendo e tal como disse atrás complementando-se, Amadeo passa da infância para a adolescência, vai para Coimbra estudar, depois para Lisboa, desilude-se com Portugal, vai para Paris, onde tem uma relação conturbada com outros portugueses, partilha um estúdio com o pintor italiano Modigliani, casa-se com Lúcia, regressa a Portugal aquando da I Guerra Mundial onde acaba por falecer de pneumonia. Tudo isto intercalado com o diário do narrador que conta também os infortúnios de “Papi”, a investigação e a dificuldade que tem com a construção da biografia e a sua própria decadência.
No final, ambas as histórias terminam com um final trágico, a morte de Amadeo e… (têm de ler o livro para saber)
Neste livro que apesar de pequeno Mário Cláudio mostra-nos toda a sua mestria como escritor, utilizando uma linguagem cuidada e (a meu ver) melancólica, dando um ambiente emotivo e de época.
Com este livro Mário Cláudio recebeu o Grande Prémio de Romance e Novela da Associação Portuguesa de Autores.

Falta dizer que li a edição de bolso da colecção “BIIS” da Leya e não consegui descobrir mais nenhuma edição (e mesmo esta foi difícil).

domingo, 11 de janeiro de 2015

Henry e Cato - Iris Murdoch


Henry e Cato é o primeiro livro que leio desta autora. Iris Murdoch escritora britânica (apesar de ter nascido na Irlanda), é uma das mais talentosas do séc. XX, para além de escritora foi também uma intelectual, formada em literaturas clássicas, história e filosofia, também com uma vasta obra nesta área científica. Apesar de toda esta formação, Iris Murdoch sempre frequentou escolas progressistas e chegou a pertencer ao Partido Comunista.
Henry e Cato, livro escrito em 1976 traz-no a estória de dois homens, Henry filho mais novo de uma família aristocrática inglesa que sempre viveu ofuscado pelo seu irmão mais velho, desprezado pelos pais, que foi viver para os Estados Unidos para se afastar de toda esta vida que nada lhe dizia em Inglaterra e Cato, o seu melhor amigo de infância, seu vizinho, também com um pai autoritário  e que decide tornar-se padre católico.
A ação começa com Henry que nos Estados Unidos sabe da morte do seu irmão e que é o herdeiro de toda a fortuna e principalmente da propriedade da família onde ele nasceu e cresceu. A partir daí Henry regressa a Inglaterra e começa uma sucessão de acontecimentos e sentimentos que lhe vão alterar para sempre a sua vida.
Paralelamente temos Cato que se encontra numa "missão" católica num bairro pobre de Londres e que se envolve num plano emocional platónico com um jovem rapaz Joe "Belo", que lhe vai trazer muitas dúvidas e dissabores.
Este livro tem uma estória fabulosa, um conjunto de personagens bem construídas com um plano psicológico e sentimental muito forte, Iris Murdoch consegue prender-nos do princípio, mostra com uma sensibilidade notória uma série de sentimentos contraditórios, o amor aos outros, a fé (ou a falta dela), a morte a perda, a inocência e também a inteligência e cultura.
Fiquei muito agradado com este livro e espero ler mais livros dela.